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segunda-feira, 8 de junho de 2015

MATHEUS 5, 13: ‘VÕS SOIS O SL DA TERRA’



Premiado e aclamado internacionalmente, o brasileiro Sebastião Salgado afirma: “Se você colocar muitos fotógrafos no mesmo lugar, todos farão fotos muito diferentes”. Isso não afasta,  porém , da essência de seus trabalhos, sobretudo do recente “Gênesis”, a presença constante do respeito, como fator essencial das relações humanas.
   Assim foi em “Outras Américas”, em Isabel, “Êxodos”, “Trabalhadores” e tantos outros que lhe renderam o reconhecimento internacional de fotojornalista social – um dos melhores do planeta. Gênesis é uma viagem no tempo e no espaço. No tempo nos lembra de Heráclito, segundo o qual o homem não se banha duas vezes nas águas do mesmo rio – águas, rio e homem estão em constante mudança. Mesmo a “imagem congelada” muda constantemente. Há nela os valores, a forma de ver, a história de cada um, do fotógrafo, do fotografado, de quem interpreta. No espaço, a obra transita do extremo norte ao extremo sul do globo, passando por Amazônia, Pantanal, santuários (como Galápagos) e a África. É, em suas palavras, uma singela homenagem a nada pequena porção intocada do planeta – 46%. A título de exemplo,  apenas considerando a Amazônia, deve haver mais de uma centena de comunidades indígenas intocadas. O objetivo apresentado – ser uma pequena colaboração para reverter os danos causados ao ambiente e poder conservá-lo para o futuro – mostra a humildade de Salgado: em livro ou no cinema. Gênesis é um gigante por  tudo aquilo a que se propõe, em especial, quanto à conscientização ambiental em busca do equilíbrio natural dos ecossistemas.
   ‘Trata-se de uma nova fase na vida de Sebastião Salgado: o desafio de sair do campo diretamente social e passar a fotografar outros animais ( que não meramente os humanos) e paisagens em condições intocadas. Em cada foto são evidentes os valores que dividimos com grupos tão antigos e aparentemente tão diferentes. Milhares de anos unidos por um clique, por uma fração de um duzentos e cinqüenta avos de segundo. Tudo em preto e branco, pois para ele o foco deve ser a clareza da situação retratada. Deve-se concentrar na situação retratada. Deve-se concentrar na situação, não em um ou mais elementos. Desta forma, o impacto social, sempre presente em seus trabalhos, está igualmente apresentado nessa fase ao retratar nuances  ambientais.
   Se uma imagem vale mais que mil palavras, as fotos de Salgado valem mais. Porém ele foi ainda mais longe. A ideia partiu de sua esposa Lélia. Ao receberem da família, a fazenda de 650 hectares na qual ele passou sua infância, ela sugeriu que a área, então com meros 0,5% da cobertura vegetal original e com solos caminhando para a desertificação, fosse recuperada, que a floresta fosse reconstruída. A porção da Mata Atlântica, nos limites entre Minas Gerais e Espírito Santo, tem hoje mais de 2 milhões de árvores nativas da região, e com elas, aves, mamíferos, nascentes. É certo que o sucesso dessa recuperação deve-se muito à reputação internacional de Salgado. Mas em um país no qual os que efetivamente podem ajudar estão acostumados a oferecer no máximo esmolas, isso o enobrece ainda mais. No Vale do Rio Doce, a fazenda é hoje uma Reserva Particular do Patrimônio Natural. Coerência com a palavra respeito, presente em cada foto, presente na força do exemplo, como se gritasse pela obrigação de se preservar e reconstruir as terras que erodimos, as terras improdutivas. Não quer com isso que voltemos às origens das áreas intocadas retratadas. Deixa, porém, clara a necessidade de mudança no comportamento humano – espécie destruidora. É preciso respeito mútuo. Assim, como em Matheus 5, 13, as pessoas são o sal da terra, o respeito deve ser o sal do homem. O legado de Sebastião Salgado: fotografias e árvores silenciosas? O silêncio estará no máximo na interpretação, na omissão de quem as analisa. Afinal, se “há tantos quadros na parede, há tantas formas de se ver o mesmo quadro “. ( Texto escrito por REGINALDO JOSÉ DA SILVA, biólogo pós-graduado em Análise Ambiental e policial militar em Londrina, página 2, ESPAÇO ABERTO, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, segunda-feira. 8 de junho de 2015).  

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