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domingo, 17 de maio de 2015

E SE SÃO PEDRO NÃO AJUDAR?



   Há cerca de um ano, pouco ou quase nada se falava sobre a problemática da água em São Paulo, mas já havia indícios de que uma potencial crise hídrica poderia atingir a maior e mais populosa cidade brasileira. O relatório 20-Fda Sabesp, de 2012, afirmava que há anos observava-se a redução nos níveis pluviométricos em várias  regiões do País. Diversas instituições ambientalistas também alertavam sobre a falta das chuvas, fruto das mudanças climáticas e desmatamentos que prejudicam o ciclo da água
   Em 2013, ja não havia chovido o suficiente sobre os mananciais que abastecem a capital paulista e sua região metropolitana. E em Janeiro de 2014 o volume do Sistema Cantareira atingiu alarmantes 22,2%. Hoje os resultados das atitudes não tomadas frente a esses alertas da natureza – e de nossa conduta ineficaz para a proteção das áreas naturais que nos fornecem água – estão sendo sentidos, por enquanto, por cerca de 20 milhões de pessoas. A crise hídrica apresenta-se com um ciclo vicioso que afeta a todos e impõe aé mesmo mudanças culturais no modo como vivemos e nos relacionamos com a água.
   Nesse meio tempo, a crise hídrica deixou de ser paulistana e tornou-se uma realidade para todo o Sudeste brasileiro – com efeito em diversas outras regiões do  país. Reservatórios de abastecimento público como o Sistema Cantareira, chegaram à reserva técnica, popularmente chamada de “volume morto”. Casas, indústrias e comércios de algumas cidades passaram a conviver com a realidade da escassez e o medo do racionamento. O cenário é desanimador e extremamente delicado, mas parece que nos acostumamos a viver no limite. O que mais precisa acontecer para  que atitudes assertivas sejam tomadas por todos os setores da sociedade, cada um com o que lhe cabe?
   Não podemos também nos esquecer do alto índice de áreas desmatadas nas regiões do entorno dos reservatórios que abastecem São Paulo : cerca de 70% da vegetação nativa foi suprimida na bacia hidrográfica e nos mananciais que integram o sistema Cantareira. Essa realidade repete-se por todo o país e compromete as nascentes e também a quantidade e a qualidade da água nesses locais. A cobertura florestal protege as nascentes e auxilia na absorção de água das chuvas, que infiltra nos solos até atingir os lençóis freáticos. Sem floresta, não há água.
   Essa crise ocorre cerca de  dois anos após a aprovação do Novo Código Florestal, que reduziu a proteção nas margens dos rios em propriedades rurais. Agora, após esse retrocesso histórico, paradoxalmente, a maior cidade do país passa por uma das maiores crises hídricas de sua história. Não seria um bom momento para repensarmos sobre como estamos lidando com a temática ambiental no Brasil?
    A resposta da natureza aos cuidados escassos que temos tido com nossas áreas naturais chegou. O Brasil está vivendo no conta-gotas. Agora,é preciso que o poder público assuma efetivamente o controle da situação: esclarecendo a população sobre como se pode economizar água, cobrando de empresas e indústrias técnicas adequadas de gerenciamento hídrico – evitando desperdício e investindo em reuso – e principalmente fazendo sua parte. Fazer sua parte, de verdade, é simples: promover a restauração em áreas estratégicas, fiscalizar efetivamente para frear o desmatamento nesses locais e melhorar os sistemas de captação e distribuição de água. Mais que São Pedro acertar na mira, os brasileiros precisam que as políticas públicas de proteção ao patrimônio natural sejam certeiras. Se não forem, a resposta da natureza será.( Texto escrito por MALU NUNES, engenheira florestal, mestre em Conservação e diretora executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza em Curitiba, página 2, ESPAÇO ABERTO, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, domingo, 17 de maio de 2015).

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